Restos de Colecção: Cinema Vox, Teatro Maria Matos e Hotel Lutécia

10 de março de 2016

Cinema Vox, Teatro Maria Matos e Hotel Lutécia

A Câmara Municipal de Lisboa, em 1963 pôs em praça o lote 879 da Avenida Frei Miguel Contreiras, com a obrigação de nele se construir uma sala de teatro em edifício misto. A empresa arrematadora do lote foi a “Sociedade Imobiliária Olívia” encabeçada por António Filipe, ex-emigrante que tinha feito fortuna no Norte de África nas pescas e na indústria conserveira.

Terreno onde viria a ser implantado o conjunto Hotel, Teatro e Cinema (indicado com a elipse desenhada)

 

 1969 Hotel Lutécia (25-04).1

Esta empresa entregou a elaboração dos projectos, do futuro conjunto cinema+teatro+hotel aos arquitectos Aníbal Barros da Fonseca, Adriano Simões Tiago, Eduardo Paiva Lopes e J. Alves Ferreira. Do enorme edifício faria parte o Cinema "Vox" ,“Teatro Maria Matos” e o "Hotel Lutécia", além de um «snack-bar» anexo ao teatro e de um restaurante panorâmico no décimo terceiro andar. Como engenheiros  responsáveis foram nomeados Luís Filipe Frazão, Fernando Gameiro, António Gameiro. Ainda a referir a intervenção dos seguintes artistas plásticos: António Paiva, J. Martins Correia, Maria Manuela Madureira, António Charrua e Espiga Pinto.

A edição deste artigo, que tentei não ser exaustiva, teve em conta a ordem cronológica das inaugurações dos três diferentes equipamentos do conjunto, pelo que começarei pelo Cinema “Vox” seguido do “Teatro Maria Matos”, e finalizando com o “Hotel Lutécia”. Nem todas as fotos estão dentro do padrão e qualidade habituais, mas foi o possível …

----   CINEMA “VOX”   ----

O cinema "Vox", cuja construção foi promovida pela "Sociedade Imobiliária Olívia", e projectado pelos arquitectos Aníbal Barros da Fonseca e Eduardo Paiva Lopes, foi inaugurado a 24 de Abril de 1969, com o filme "Jogos Perigosos".

 

A exploração desta sala de cinema ficou entregue à empresa "Filmes Lusomundo", cuja direcção era partilhada por João Ildefonso Bordalo e o tenente-coronel Luís Augusto Silva. A sua sala dispunha de 537 lugares todos em plateia, podendo exibir filmes até 70 m/m com som stereo. Bilhetes eram de preço único: 15$00 à tarde e 25$00 à noite.

 

Programa de 4 de Fevereiro de 1971, referente à exibição do filme "Um Homem e a sua História", de Albert Finney

  
bilhetes gentilmente cedidos por Carlos Caria

A segunda película a ser exibida nesta sala de cinema foi o filme "Helga-O segredo da Maternidade" que muita polémica gerou na altura, tendo mesmo sido objecto de um despacho especial, autorizando a sua visualização apenas a maiores de 21 anos ... «o filme será dobrado em português devido ao seu interesse científico, que poderia prejudicar-se com a gravação de legendas.» in: “Diario de Noticias”.

O “Vox” encerraria em 31 de Janeiro de 1985 com a última exibição do filme “Os Goonies”.

Antes de se tornar no “King Triplex”, o “Vox” passou por uma fase intermédia - o “Espaço Voxmania”, vocacionado para concertos de diversas bandas, como os “GNR” ou os “Heróis do Mar”.

 

O “King Triplex” foi inaugurado em 27 de Outubro de 1988, substituindo o “Vox”. Espaço com 3 salas tendo a sala 1 capacidade para 162 espectadores, e as salas 2 e 3, 113 e 109 espectadores respectivamente, vê a sua exploração, em 1990, entregue à "Medeia Filmes" do realizador Paulo Branco. Na  cave deste cinema depois de aí ter funcionado uma discoteca, em 1995 a "Assírio & Alvim" abriria uma livraria, projectada pelos arquitectos Manuel Graça Dias e Egas Vieira e onde se podia saborear doçaria alentejana.

Este espaço, ultimamente já só com 2 das 3 salas iniciais, viria a encerrar, definitivamente, em 24 de Novembro de 2013, em virtude da empresa proprietária do espaço ter exigido um aumento para o triplo da renda até então vigente, ao abrigo duma lei de 2011, que viria a inviabilizar a sua sustentabilidade. Em 26 de Junho de 2014 o edifício seria vendido em leilão por 1,2 milhões de euros.

Actualmente

----  “TEATRO MARIA MATOS”  ----

O "Teatro Maria Matos", foi inaugurado em 22 de Outubro de 1969, com a presença do Chefe do Estado, Almirante Américo Thomaz, o Ministro da Educação Nacional, Doutor José Hermano Saraiva e o Ministro das Corporações e Previdência Social, Dr. José João Gonçalves de Proença . A exploração e direcção artística foi entregue ao actor, e empresário Igrejas Caeiro que criou para o efeito, a  nova empresa teatral “Tablado - Promoção de Artes Cénicas, Limitada”. O Teatro  abriu as portas ao público com a estreia da peça "Tombo no Inferno" da autoria de Aquilino Ribeiro, e encenada por Igrejas Caeiro.

 

Proposta de assinatura para o “Teatro Maria Matos”


gentilmente cedida por Carlos Caria

O “Teatro Maria Matos”, á altura da sua inauguração, possuía uma sala com 760 lugares distribuídos por plateia e balcão, apetrechado com todos os requisitos para realizar qualquer género de espectáculos teatrais: palco elevatório e rotativo, equipamento de luzes que o colocava na vanguarda de todos os teatros portugueses, camarins espaçosos para os actores e equipados com ar condicionado e instalações sonoras representativas da última palavra em tecnologia sonora em Portugal.

 

  
gentilmente cedidos por Carlos Caria

Quanto aos espectadores retardatários, este Teatro inovou:

«Uma inovação que nos parece digna de aplauso: dado que será posta em vigor a proibição de entrada na sala, seja a quem for, uma vez iniciado o espectáculo, um circuito fechado de TV permitirá aos retardatários assistir ao que entretanto se passa no palco, através de um "écran" instalado no átrio. Nos intervalos de mudança de cena, a entrada será permitida.» in revista Flama

Quanto à avaliação das suas instalações:

«O Teatro Maria Matos foi evidentemente prejudicado pelo facto de se incluir no conjunto mais um hotel e um cinema: os "foyers" são reduzidos ao mínimo, acanhados e não podem, assim, desempenhar as funções que lhe são inerentes: funções de convívio social (aqui a pequena sala do bar apresenta uma solução positiva), mas também uma função mais importante, de elo de ligação entre os vários tempos de representação, e não uma quebra no ritmo do ritual que se desenrola antes e continuará depois do intervalo, no "santuário".» in revista "Binário"

                                       Estreada em 16 de Março de 1974                         Estreada em 13 de Setembro de 1977

          

                           Estreada em  13 de Setembro de 1977                                  Estreada em 2 de Fevereiro de 1978

 

O «foyer» antes das obras de remodelação

Em 1982, o “Teatro Maria Matos” foi adquirido pela Câmara Municipal de Lisboa, deixando de ter companhia residente e passando para um regime de acolhimento de projectos independentes e de companhias mais pequenas de Teatro, de Dança e de Música. Em 2003, a gestão deste Teatro transita para a empresa municipal “EGEAC - Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural”.

 

 

Dado o seu estado de degradação, em Agosto de 2004, deu-se início a uma intervenção de profunda remodelação deste espaço cultural, conferindo-lhe uma nova identidade e dotando-o de melhores condições para a apresentação de espectáculos. O projecto incluiu a remodelação da sala e dos bastidores, a melhoria da acústica, da iluminação, da climatização, o reforço da segurança e a eliminação das barreiras arquitectónicas. O “Maria Matos Teatro Municipal” reabriria a 27 de Março de 2006, com a sala principal, com capacidade para 447 lugares, e dotado de um lounge, de um café e de uma sala de ensaios.

----  HOTEL LUTÉCIA  ----

O "Hotel Lutécia" foi inaugurado em 8 de Dezembro de 1969, com a presença do director-geral do turismo, engenheiro Álvaro Roquete. Propriedade da empresa "Sociedade Imobiliária Olívia, Lda." e exploradora desta unidade hoteleira, teve como seu primeiro director João Fernandes.

 

          

Este hotel, apesar de inaugurado oficialmente a 8 de Dezembro já se encontrava em funcionamento desde o dia 1 do mesmo mês, oferecendo 151 quartos e suites. Equipado com ar condicionado em todas as dependências do hotel, como as salas de jantar e de estar incluindo os "snack-bar" e salão de banquetes para 300 pessoas, dispunha de um parque automóvel privativo para 200 carros, estando prevista, na altura, a construção de uma garagem subterrânea com três pisos e capacidade para várias centenas de automóveis.

Fotos aquando da sua inauguração em 1969

Hall de entrada e sala de estar

 

Snack-bar e quarto duplo

 

«Um moderno e compacto monobloco EFACEC de 13 celas, com 3 transformadores de 315 kVa a 1 de 125 kVa alimenta em energia eléctrica o complexo urbano onde está integrado o hotel ora inaugurado».

O actual "Lutécia Smart Design Hotel", com 175 quartos e classificado com 4 estrelas, foi reformado em 2014 dispondo de 9 andares temáticos, bem como um restaurante "In Fusion" que serve cozinha portuguesa e indiana. Os quartos estão dispostos pelos pisos “Indigo”, “Aqua Garden”, “Sunflower”, “Rising Sun”, “White Space”, “Funky”, “Kiss me” e “Disco”, e incluem mobiliário moderno e de design, com televisões de ecrã plano interactivas. Todos os quartos têm máquina de café expresso e a maioria dos quartos oferecem vistas panorâmicas da cidade.

 

 

 

fotos in: Hemeroteca Digital, Arquivo Municipal de Lisboa, Maria Matos - Teatro Municipal, Lutécia Hotel, IÉ-IÉ

3 comentários:

mike disse...

Lembro com saudade o concerto dos GNR no Voxmania.
Foi uma tal enchente que o espaço se tornou pequeno.
No inicio fiquei numa das cadeiras mas depressa fui para a frente junto ao palco onde os fãs se juntaram em pé e aos saltos a cada tema dos GNR.
Se não me engano foi o primeiro concerto dos GNR em Lisboa.
Eles voltaram mais tarde para um concerto no Coliseu que resultou na gravação de um duplo-LP em cuja foto da capa eu tive a sorte de aparecer :)

Coisas da juventude!
Obrigado por me fazer recordar esses bons tempos, os maravilhosos anos 80!

Ainda acerca do Voxmania, sei que algum tempo depois desse concerto dos GNR houve um incêndio que destruiu esse espaço, acho que foi depois disso que mudou para cinema.

João Camacho disse...

Boas recordações. A máquina do tempo é infalível Habituamo-nos a gostar de espaços de excepção. Pena que essa "loucura" colectiva
sublime não seja partilhada nos dias de hoje.

maria lourenco disse...

Fala-se tão pouco do Voxmania. Eu trabalhei lá desde que abriu até o incêndio que destruiu por completo todo o espaço. Aquele espaço não era apenas para concertos, era uma enorme discoteca com dois bares, um pub e ainda uma zona de snooker. Eu era uma das meninas das caixas de pagamento nos dias de discoteca, e barmaid no pub nos outros dia. Saudades